Minhas Mémorias Manauaras
Prólogo - Parte I
Era manhã de inverno, chuvas brandas se derramavam em choro copioso sobre as ruas de pedra e arrime. Os grossos galhos da velha Tucandeira dançavam embalando meus sonhos de olhos abertos, que ainda olhavam o borrado horizonte sem buscar cor nem movimento. As mãos tremulas apoiavam-se na velha bengala, o castão de marfim dava-me ares de fidalgo e os sapatos pouco engraxados saudavam os recitais do teatro, talvez porque eu caminha-se pouco ou por mais pura e saborosa preguiça que me acudisse.
O som da chuva era bom o suficiente para as terras tropicais de Manaus, só o velho bonde que acudia de meu sono em horas incertas, como aquilo me irritava. Já havia mandado inúmeras cartas para a prefeitura pedindo que colocassem trilhos de castanheira a uns metros da minha casa, porém depois de varias tentativas me asseguraram que isto não os diz respeito nem que valia a real necessidade. Imaginem! Na própria Paris ou mesmo na velha Irlanda são colocados puros cedros para não alarmar as pessoas por este maldito e barulhento bonde, que de longe me maltrata e me tira do meu simples e cônego estado de espírito. Apenas uma santíssima alma poderia me tirar deste mundo de problemas que nunca acaba, a linda e bela Mariana seria sempre minha única salvação.